Primeiramente, é bom esclarecer, mesmo que em poucas linhas, o que é APAC.
APAC trata-se de um método que foi desenvolvido a partir da experiência de um grupo de voluntários, liderado pelo advogado Mário Ottoboni que, em 1972, na cidade de São José dos Campos/SP, resolveu, de maneira informal e despretensiosa, evangelizar e dar apoio moral aos internos do presídio Humaitá, à época, abalado por constantes rebeliões.
Dois anos mais tarde, tal grupo, então denominado “Amando o Próximo, Amarás a Cristo”, resolveu instituir a entidade civil de direito privado sem fins lucrativos, a Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (APAC) de modo a proporcionar um certo respaldo jurídico – tanto para os presos quanto para a própria equipe - para suas atividades que, até então, foram recebidas com certa desconfiança pelos demais atores da execução penal local (OTTOBONI, 2001). Graças ao êxito da experiência, o método ganha vários adeptos mundo afora, razão pela qual, em 1995, é criada a Fraternidade Brasileira de Assistência ao Condenado, entidade que congrega, supervisiona e fiscaliza todas as APACs do Brasil e orienta a aplicação das diretrizes apaqueanas no exterior, sendo filiada a Prison Fellowship International (PFI), organização consultiva da ONU para assuntos penitenciários. Vale ressaltar ainda que, graças ao êxito alcançado pela APAC de Itaúna - fundada em 1986 -, o método apaqueano recebe, desde 2001, apoio institucional do Projeto Novos Rumos na Execução Penal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que, desde então, dá suporte à criação de APACs em todo o Estado.
No espaço físico onde as APACs se erguem (o chamado Centro de Reintegração Social), coloca-se em prática um método de valorização humana baseado em doze elementos. São eles, em suma: proporcionar trabalho a todos os assistidos (e não só mera ocupação de tempo com atividades que não vão lhe proporcionar qualquer acesso ao mercado de trabalho), promover a solidariedade entre eles, garantir-lhes assistência religiosa, jurídica e à saúde, incentivar o envolvimento dos familiares, de voluntários e, sobretudo, de toda a comunidade que, um dia, terá acolher de volta os irmãos que violaram a lei.
Já o sonho de trazer o método em Belo Horizonte partiu de dois motivos.
O primeiro tem a ver com a pesquisa realizada pelo professor Virgílio de Mattos (2008), entre os anos de 2005 e 2008 e que deu origem à obra “A visibilidade do invisível”, na qual é traçado o perfil sócio-econômico da mulher encarcerada em Belo Horizonte, no início do século XXI, a partir de dados colhidos, em 2005, junto às presas provisórias do Departamento de Investigações (D.I.) da capital e do Complexo Penitenciário Estevão Pinto (CPFEP). É estarrecedor perceber o incremento do encarceramento feminino na capital mineira (seguindo movimento que ocorre no mundo inteiro, diga-se de passagem) e o quanto a precariedade do mercado de trabalho provoca o envolvimento da mulher com o crime. Só para se ter uma ideia, em 1995, havia 53 presas no CPFEP. Dez anos depois, em 2005, esse número subiu para 192 e hoje são estimadas mais de 400 presas na mesma unidade prisional. Ainda de acordo com a obra, 50% das presas eram jovens de 20 a 29 anos, 67% delas sem qualquer contato anterior com o sistema penal, 69% exercia uma atividade laborativa lícita na época do crime (deste número 54% sustentava a família e 74% trabalhava sem carteira assinada), 82% tem filhos e 63% tem apenas o ensino fundamental completo. Outro dado importante: 50% das mulheres foram condenadas por tráfico de drogas, crime que, embora hediondo nos termos da lei, não é praticado com violência nem grave ameaça. Trocando em miúdos, muito do envolvimento feminino com o crime vem do fato de a mulher pobre precisar sustentar sua família sozinha e o fruto de seu trabalho – informal, sem garantias ou direitos trabalhistas e pessimamente remunerado – não ser o suficiente para isso.
O outro motivo tem a ver com a visita do Grupo de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade à APAC de Nova Lima, em 2007. O primeiro contato com o método e com o tratamento efetivamente humano conferido aos recuperandos e aos seus familiares foi o suficiente para que o Grupo percebesse a necessidade de fundar uma APAC em Belo Horizonte e, desde então, tem reunido esforços para tanto.
Em 19 de outubro de 2009, foi realizada a Audiência Pública na sede do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais, oportunidade em que o método APAC foi apresentado à comunidade belorizontina, por meio da palestra proferida pela Desembargadora Jane Silva, Coordenadora do Projeto Novos Rumos na Execução Penal do TJMG. O evento contou ainda com o Vice-presidente do CRP-MG, Rodrigo Torres de Oliveira, o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Deputado Durval Ângelo, o então coordenador de Direitos Humanos da Prefeitura de Belo Horizonte, Daniel Nepomuceno, o pároco da Igreja da Nossa Senhora do Carmo, Frei Gilvander Moreira, a Defensora Pública Marolinta Dutra, o Delegado de Polícia Civil Caio Almeida Neves Martins, e o Coordenador-executivo do Projeto Novos Rumos na Execução Penal, o juiz Luiz Carlos Rezende e Santos. Na ocasião, foi unânime o entusiasmo de todos os presentes que, em suas manifestações, frisaram a necessidade de Belo Horizonte, o quanto antes, construir sua própria APAC.
No mês seguinte, foi constituída uma Comissão Representativa que, após conhecer a APAC de Itaúna, a experiência modelo do método, assumiu a missão de criar juridicamente a associação. Assim, no último 16 de março, foi realizada a Assembléia Geral para aprovação do Estatuto e eleição da Presidência, do Conselho Deliberativo e do Conselho Fiscal da APAC feminina de Belo Horizonte.
POR ORA ESTAMOS PROVIDENCIANDO O REGISTRO DA ASSOCIAÇÃO, AO MESMO TEMPO EM QUE PROCURAMOS O IMÓVEL ONDE SERÁ ERGUIDO NOSSO CENTRO DE REINTEGRAÇÃO SOCIAL. POR ISSO, PRECISAMOS DE MAIS ADESÃO DOS BELORIZONTINOS AO PROJETO, PARA QUE JUNTOS POSSAMOS SENSIBILIZAR OS GESTORES PÚBLICOS PARA A IMPORTÂNCIA DE TER UMA APAC NA CAPITAL.
Andreza Lima de Menezes
Presidente
Referências
OTTOBONI, Mário. Vamos matar o criminoso? São Paulo: Paulinas, 2001.
MATTOS, Virgílio de. A visibilidade do invisível – Entre o “Parada, polícia” e o alvará de soltura – Criminalização da pobreza e encarceramento feminino em Belo Horizonte no início do século XXI – Percursos e conclusões de um grupo de pesquisas sobre criminalidade, violência e direitos humanos em duas unidades prisionais femininas de Belo Horizonte. Belo Horizonte: Fundação MDC, 2008.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Ei, Andreza!
ResponderExcluirNada como realizar um sonho, né?! O trabalho é árduo, mas gratificante. Sucesso!